Porque cantam as aves?

30-07-2024

Jolei,
O canto das aves é uma das mais belas manifestações da Natureza.


Porém, apenas, só os passeriformes (passarinhos), e nem todos, cantam. Fazem-no por imitação dos progenitores, mas a maioria herda geneticamente esse talento, já que muitos juvenis das aves migradoras fazem a rota para sul sozinhos e nunca mais veem os pais. O canto dos machos é essencialmente primaveril e territorial e visa atrair uma fêmea para o local selecionado por este para um ninho. Esta escolhe o parceiro que canta melhor por isso alguns machos são polígamos, porque podem atrair várias fêmeas, embora tenham sempre uma fêmea principal a qual tem maior atenção deles. Elas sabem sempre diferenciar pelo canto o macho da sua espécie e eis outra função do canto.

As frases (trinados − série de notas agudas articuladas rápida e alternadamente) do canto da mesma espécie não são exatamente iguais, variando ligeiramente consoante a região. Os tentilhões da Europa Central, por exemplo, têm uma terminação ascendente enquanto os de Portugal, fazem a terminação descendente.

Mas o que dizem os cantos dos machos? «Escolhi um bom sítio para o ninho e repara como eu canto melhor do que o meu vizinho».

Depois do acasalamento, os cantos terminam, as fêmeas põem os ovos, chocam-nos e geralmente abandonam os filhotes a cargo dos machos. Podem inclusive arranjar outro parceiro e fazem uma nova postura.

Há, entretanto, outras vocalizações comunicacionais entre pares e descendentes, como o som de alarme, face à aproximação de predadores ou a presença de um intruso. Os passarinhos, que não cantam, como os pardais, usam outras estratégias de acasalamento, que passam por vocalizações específicas, oferta de presentes − um rebento de flor, um apetitoso inseto, uma baga madurinha ou simplesmente algo que desperte a atenção da fêmea. Normalmente os machos destas espécies possuem plumagem vistosa que se realça particularmente na primavera ao invés das espécies canoras, mais discretas.

Há ainda outras diferenças no canto, as aves da cidade cantam uns dBs acima das aves do campo ou dos bosques, devido ao ruido.

A Felosa-palustre, uma ave que é uma raridade em Portugal, não tem canto geneticamente apreendido. O canto dela é uma imitação de sons que houve no meio onde nidifica. Tanto imita sílabas de outras aves, como outros sons do meio ambiente. Incrível, mas esta modalidade do canto não é exclusiva desta espécie. Estorninhos e outras felosas de Portugal são igualmente especialistas em cantos imitativos.

No Hemisfério Norte a partir de julho raramente se ouve uma ave a cantar, porque terminaram as posturas, os juvenis já voam e chegou o tempo de partida para as espécies migradoras e de descanso para as residentes. Então passam a emitir apenas sons de contacto ou territoriais.

Apesar do início do verão, ainda vai a tempo de desfrutar das melodias dos passeriformes. Procure um local com vegetação e calmo. Há sempre um macho solteirão que ainda canta por esta altura.

E pronto, este último parágrafo seria o happy end para este artigo se o prutuguesito lusito não estivesse por aí à espreita.

E de quê?

Devido às chuvadas de inverno o manto vegetal desenvolveu-se demasiado. Foi um bónus para muitas das espécies nidificantes que se refugiam no solo. Incautos, não sabiam da psicomancia do lusito. Ele adora roçar mato convocando não sei que mortos nesta prática obsoleta. Os prazos obrigatórios já terminaram em maio para os privados. Porém estas praxes continuam indiscriminadamente. Se pretendia viajar até a um suposto local tranquilo para fugir ao ruido das cidades, desengane-se. No sítio mais ermo, mais inacessível, lá está um qualquer lusito de roçadeira em punho, qual moscardo mecânico a irritar os seus ouvidos.

Conclusão, muitas espécies tardias como os picanços são esmagados pelas máquinas sem dó nem piedade, para não falar das segundas posturas quando as primeiras correram mal.

Mas o lusito não se fica por aqui. As podas tardias atingem o acme nesta altura, decepando literalmente as árvores de jardins e bosquetes destruindo os dormitórios de muitas aves já em bandos após o desenvolvimento dos juvenis.

Ainda há poucos dias estive na Europa Central que também foi assolada fortemente pelas chuvas. Mas aí o bom senso é determinante para se concluir porque as espécies estão a declinar em Portugal e a proliferar em países como Alemanha, Polónia, ou Países Baixos.


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