A emancipação feminina

17-11-2022

Lady in red,
Começo esta reflexão por admitir o quão penoso ainda me parece utilizar expressões como emancipação feminina em pleno século XXI. 


Ainda existem coisas inimagináveis a acontecer neste mundo, algumas delas que implicam retrocessos de décadas. Um exemplo muito prático seria o facto de o Supremo Tribunal dos Estados Unidos ter achado por bem considerar que as mulheres são incapazes de tomar decisões sobre o seu próprio corpo.

Contudo existem exemplos igualmente deprimentes em contexto desportivo.

Há cerca de uma ano e meio, a seleção feminina de andebol de praia da Noruega decidiu entrar em jogo com calções ao invés de basicamente jogar de biquíni. O resultado desta violação claramente imperdoável foi uma multa a ser paga pelos responsáveis da equipa.

É absurdo o facto de o desporto feminino ainda ser considerado uma forma de sexualizar a mulher. Considero que ainda é penosamente óbvio o facto de, no contexto de desporto feminino, as mulheres serem sempre consideradas mulheres atletas e nunca só atletas. Aqui mesmo em Portugal isso é óbvio pelas denúncias de casos de assédio sexual em contexto de futebol feminino.

Eu pratiquei desporto federado, basquetebol e futebol, durante cerca de 8 anos da minha vida. Nunca fui alvo de qualquer tipo de abordagem que se possa enquadrar no cenário mencionado, mas entristece-me profundamente pensar nas meninas de 10 ou 12 anos que podem estar a ler estas notícia que surgiram e deixar de pensar em praticar desporto. Entristece-me quantas acharam que estes comportamentos eram "normais". Entristece-me também, ao mesmo tempo, o quão pouco sinto que se falou desta temática após ter surgido, apenas notas de rodapé a mencionar as "penas" de suspensão dos visados. Os programas televisivos e os jornais passam horas a falar da renúncia do Rafa à seleção ou das mil e uma polémicas do Cristiano Ronaldo, mas não de possíveis medidas para minimizar a ocorrência destes tristes acontecimentos.

Todavia, existe um reverso da medalha muito curioso. Por um lado, o desporto sexualiza a mulher em várias situações e discrimina-a em inúmeras outras (muita dificuldade de acesso a cargos no contexto desportivo, discrepâncias gritantes a nível salarial e de condições, entre outros). Por outro, parece que ignora completamente algumas particularidades por efetivamente estarmos perante o contexto de desporto no feminino.

Uma das polémicas do europeu feminino este ano foi o facto de a seleção anfitriã, a Inglaterra, solicitar à Nike um novo equipamento. Como toda a população sabe, espero eu, as mulheres sofrem sempre mais que os homens, principalmente por serem um veículo reprodutor. Como tal, as mulheres têm a menstruação, o que torna calções brancos um pesadelo para qualquer jogadora. O facto de, em pleno século XXI, ficar contente por o Manchester City ter acordado com a Puma a troca de equipamento para calções vermelhos deprime-me.

As mulheres ainda são discriminadas em contextos desportivos. Sinceramente julgo que não verei outra realidade que não essa. Todavia, enche-me de alegria ver que não desistimos de lutar por sermos apenas atletas e continuarmos a perseguir diferentes estágios no nosso processo de emancipação no desporto.